terça-feira, março 31, 2009

O caráter nacional.







Lembram-se do recente episódio da advogada Paula Oliveira, que mentiu às autoridades suíças sobre um suposto ataque que teria sofrido de neonazistas?
Bem, não sei em você, mas em mim provocou um profundo mal-estar. Como agora se sabe, não só o ataque não ocorreu, como também ela não sofreu o alegado aborto de dois bebês. Simplesmente não estava grávida.

Por que o mal-estar diante do fato? Primeiro, porque ele reforça a impressão de que nós brasileiros não somos confiáveis. E, mais importante, porque o preconceito talvez não seja de todo destituído de fundamento.

É certo e óbvio que não somos todos mentirosos. E também não é correto fazer generalização sobre o "caráter" de um povo. Mas quem de nós brasileiros, com algum grau de consciência e noção de ética, há de negar que uma malandra propensão a driblar a verdade, embrulhá-la em artifícios retóricos ou escondê-la nas dobras de histórias mal contadas é um traço do modo de ser deste país? Não raro socialmente valorizado como esperteza, "manha" ou “jeitinho brasileiro”.

Não há no Brasil, a começar pelo exemplo cotidiano dos governantes e das autoridades do Estado, o respeito às regras de conduta, às leis estabelecidas, e ao certo e o errado.

Nessa matéria, a nossa marca tem sido a ambigüidade. Na esfera pessoal e privada, a ambigüidade pode ser útil para evitar conflitos ou deixar certo espaço para adaptação de regras e práticas a circunstâncias e contextos variáveis. É tênue, porém, a fronteira entre a ambigüidade inofensiva e a dissimulação deletéria - pela omissão, negação ou distorção dos fatos - a serviço da transgressão, do embuste ou da fraude.

O traço "cultural" da ambigüidade, em suas modalidades mais e menos benignas, reflete estratégias de sobrevivência e dominação que vêm de longe. Entre nós, difundiu-se essa prática como um estratagema recorrente para driblar, por bons ou maus motivos, os obstáculos num, muitas vezes kafkiano, universo das obrigações burocráticas. Via de regra as impostas pelo Estado.

Aliás, não é se não pela excessiva interferencia e pelo “peso” do Estado nas costas da sociedade, que essa má conduta difundiu-se e, fez crescer, de forma endêmica, a corrupção no Brasil. Não há a menor duvida que o Estado e seus agentes são os grandes incentivadores e corruptores da Nação. Criam dificuldades de toda a ordem à vida dos cidadãos para em seguida, venderem facilidades... E o fazem como forma de manter “no cabresto” toda a sociedade, que, dessa forma, depende dos “favores” dos políticos e dos burocratas para quase todas as atividades. Do último subalterno das prefeituras, aos titulares das instituições federais.
Se as exigencias burocraticas fossem menores, se os impostos fossem menos escorchantes, pouco disso subsistiria.

Visto em conjunto, esse panorama revela a escassa experiência histórica dos brasileiros com o que no mundo anglo-saxão se chama "rule of law", o império da lei. Não apenas o conjunto de leis, mas a sua aplicação isonômica, eficiente, à todos os cidadãos. Nada mais essencial ao ideal democrático.

Os anglo-saxões não mentem menos na esfera pública porque são congenitamente mais virtuosos, mas sim porque aprenderam que a mentira ou a omissão tem custos que podem trazer grandes desvantagens, diante de um sistema legal que opera com um razoável grau de equidade e eficiência. Além disso, via de regra, há um bom exemplo das autoridades constituidas.

Em nenhuma outra área da vida brasileira a mentira ganhou tantas pernas e o embuste tantas formas quanto na política, sobretudo na ampla zona de interseção em que ela se encontra e se mistura com os negócios públicos e privados. Não sejamos ingênuos: em nenhum lugar do mundo os ideais da "transparência na política" e da separação entre a política e os negócios se concretizaram plenamente. E em nenhum lugar os protagonistas falam com absoluta sinceridade sobre como o jogo é jogado, mesmo diante das evidências mais claras. Mas convenhamos que no Brasil o desapego à verdade dos fatos chegou a extremos.

Os partidos políticos tornaram-se o emblema dessa enfermidade, e a contribuir ativamente para propagá-la. O discurso não apenas perdeu substância, como se tornou, na média, espantosamente cínico. E para manterem o “status quo” esmeram-se em proteger um sistema eleitoral viciado, deturpado e de uma representatividade duvidosa...

O que precisamos fazer para amenizarmos, pelo menos, os efeitos públicos desse “caráter nacional”?

Criar filtros que possam minimamente separar o joio do trigo e, democraticamente, depurar a vida política do País. Para tanto, reformas e ajustes institucionais são absolutamente necessários. Mas elas só se farão, infelizmente, pela pressão da sociedade, e não pelo virtuosismo dos políticos...

E é preciso acharmos um meio das instituições atuais serem céleres e capazes de condenar, com eficácia, os que roubam dinheiro público e praticam outros atos lesivos a sociedade, ou será muito difícil reverter, democraticamente, a tendência acentuada de degeneração da vida pública, no Brasil. E como sabemos, a depuração dos costumes políticos por via não democrática, via de regra, leva ao arbítrio, e não à solução dos problemas que diz atacar.



O artigo original é de Sérgio Fausto, coordenador de Estudos e Debates do iFHC, está significativamente alterado pelo Freeman.

quarta-feira, março 11, 2009

Destruindo empregos


A realidade da crise traz várias dificuldades para o governo Lula, situação que, em si, já é um grande desafio para uma administração despreparada e só acostumada com ventos a favor.

A mais visível dessas dificuldades é o desemprego e mostra bem a virada da situação: depois de meses anunciando recordes dos empregos formais – como se eles fossem os criadores da bonança - o governo agora precisa lidar com as demissões. E, em vez de atacar o problema, buscando soluções eficazes, procura culpados, ora na conjuntura internacional ora, nas empresas locais.

O presidente, recentemente, manifestou-se indignado com as demissões na Embraer, reclamou de não ter sido avisado, chamou a diretoria da companhia e, não falou mais nada. Como em outras ocasiões, Lula parece esperar para que a situação se resolva por si. Por outro lado, para manter os holofotes, a Justiça do Trabalho mandou suspender as demissões e, também, chamou a empresa para uma reunião de conciliação.

Tem sido sempre assim. Quando o presidente e seu governo resolvem agir, agem equivocadamente, com o velho espírito sindicalista, isto é, apenas reivindicatório. Não agem com postura pró-ativa em busca de soluções efetivas.

Essas ações, além de demagógicas, só indicam o despreparo do governo e a postura de órgãos que só agem com o intuito de criar problemas para a economia real, não compreendendo que, no final, a resultante é sempre prejudicial para a própria sociedade e o país.

Será que o governo se considera no direito de intervir na gestão de empresas privadas? A Embraer tem o governo entre seus acionistas (numa posição minoritária) o que, aliás, tem sido muito bom, para o governo, em termos financeiros.

A Embraer também tem financiamentos do BNDES, em operações que o banco estatal sempre considerou boas e rentáveis. Trata-se de financiar a expansão e as exportações de uma companhia de ponta. É bom para a economia nacional, gera renda e empregos. Isso também não dá ao BNDES o direito de intervir na gestão da empresa, desde que ela esteja cumprindo seus contratos com o banco, como está.

Mas a reação do presidente Lula diz o contrário. Tanto que os sindicatos, obviamente, foram pedir ao presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que ele vete formalmente as demissões. Como não há base legal para isso, resta a pressão política, inclusive sobre a Justiça do Trabalho.

Esse ambiente todo gera duas consequências, ambas ruins.
A primeira é que sinaliza e aumenta o risco de se investir no Brasil.
Suponha que a empresa fosse, de algum modo, obrigada a manter os empregos e, com isso, sem vendas, passasse a acumular prejuízos. Quem pagaria?
O que leva à segunda consequência possível: o balcão de favores. Ok, diria a diretoria, operamos no vermelho, mas em troca o governo poderia facilitar isto ou aquilo.

Tudo considerado e, não se abrindo esse tipo de balcão, a Embraer vai manter as demissões pela simples razão de que não tem o que produzir com esse pessoal. Toda a ação do governo terá apenas criado um ambiente negativo, sem salvar os empregos.

O que poderia ser feito, de concreto, para o problema do desemprego causado pela crise?

Primeiro, de imediato, ampliar para todos os benefícios do seguro-desemprego. O que fez o governo? Anunciou que fará isso, mas apenas para determinados setores.

O argumento oficial diz que tal medida só faz sentido nas áreas mais sensíveis à crise, mas a verdade é que não há dinheiro, já que o governo quer gastar recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) em outras atividades. O dinheiro do seguro-desemprego deveria ir apenas para isso.

A segunda medida efetiva seria modificar a legislação de modo a ampliar o campo de negociação entre as empresas e seus trabalhadores. Advogados trabalhistas e especialistas no setor vêm dizendo, há anos, que as atuais leis que regulamentam as negociações são muito estreitas e inseguras. Para suspender contratos de trabalho ou reduzir jornadas e salários, por exemplo, a lei exige condições quase impossível de cumprir - que a empresa, por exemplo, esteja quase quebrada.

As circunstâncias dessas demissões, nesse caso, são óbvias: o mercado de aeronaves despencou em todo o mundo. E, aqui entre nós, nenhuma empresa séria e competitiva demite sem razão. Mão de obra especializada e qualificada, como da Embraer, custa MUITO para formar.

No sufoco, trabalhadores e empresas têm feito esses acordos ignorando algumas condições, o que pode gerar passivos trabalhistas. Nada impede, dizem especialistas, como José Pastore, que os trabalhadores ou mesmo o Ministério Público venham, no futuro, a contestar esses acordos e exigir pagamento integral de salários e atrasados. O que é um verdadeiro absurdo e demonstra o nível da insegurança jurídica vigente no pais. Por isso, muitas empresas, apesar do custo e da perda efetiva dessa mão de obra têm preferido ir direto para a demissão, sobretudo quando esperam uma crise prolongada.

Na mesma linha, a ministra Dilma Rousseff – outra sumidade do presente governo - disse que a decisão da Justiça de suspender as demissões na Embraer e chamar uma audiência de conciliação dá à empresa uma oportunidade de negociar de maneira "mais humana". Disse ainda que a companhia deveria ter sido mais humana desde o início, já que foram "questões internacionais, e não nacionais, que a levaram a demitir".

Vejam o absurdo da declaração (que mostra, bem, o nível desse governo). Mais uma vez, aparece a obsessão de culpar alguém, além de algo muito estranho: quer dizer que, se as causas fossem nacionais, a empresa não precisaria ser mais humana?

Da "conciliação" da Justiça do Trabalho pode resultar o quê? Alguns benefícios adicionais aos demitidos? Mas não os empregos, que poderiam ser salvos, ao menos em parte, se as leis trabalhistas fossem mais realistas, beneficiando empregados, empresa e o próprio país.



O artigo original é do jornalista Carlos Alberto Sardenberg. Está significativamente modificado pelo Freeman.

segunda-feira, março 02, 2009

Prêmio Apache 2009.


No meu retorno encontro uma indicação ao prêmio Apache, feito pela minha ciber amiga Star.
Fico muito feliz pela indicação, mas no meu caso creio ser imerecido.
Embora eu defenda os valores da democracia e condene qualquer forma de terrorismo, não publiquei nada específico sobre este último assunto. De toda a forma agradeço a lembrança. O mais importante para mim é o companheirismo da minha amiga Star e a combatividade de muitos blogueiros que não se acomodam e não esmorecem diante da semvergonhice oficial que tomou conta deste país.
Saudações a todos e, parabéns Star.


PS: Agora, se for possível mandar-me o prêmio, fisicamente, a conversa é outra. EU ficarei, realmente, muito feliz, pois há tempos venho estudando uma forma - além das palavras - de CONVENCER EFICAZMENTE nossos governantes a se comportarem. Creio que com esse prêmio a oportunidade chegou. Então, farei uma breve incursão à Brasília e, desta feita, tenho a certeza que os convencerei...