domingo, abril 13, 2008

Deserto moral - encorajando o perfil do ditador.


De um lado, tome-se a submissão dos partidos aliados; de outro, observe-se a oposição sem conseqüência dos adversários; junte-se a isso a omissão de gente, outrora, representativa da sociedade e fica fácil compreender porque o presidente trata a tudo e a todos com suprema arrogância.

Interpreta a lei à luz de sua conveniência; altera os fatos conforme seu interesse; ataca aos desaforos todo e qualquer contraditório; substitui o debate pela agressão verbal; enerva-se se os Poderes Legislativo e Judiciário não se comportam como linhas auxiliares de seus projetos e, só convive bem com a obediência e a reverência.

As vozes que se poderiam materializar um contraponto a Lula optaram pelo silêncio. Alguns, como os movimentos sociais, o sindicalismo e os estudantes, renderam-se à cooptação, ou porque são farinha do mesmo saco, ou porque se beneficiam de alguma forma. Outros, como a universidade e o mundo da cultura, abriram mão do exercício da crítica - por amor a verbas federais, a preguiça ou a intimidação ideológica.

Os políticos certamente o fazem por cálculo. Os aliados ficam ali, achando tudo uma maravilha enquanto podem desfrutar de uns nacos de poder que Lula concede para deleite da fisiologia.
Os da chamada oposição não querem "bater de frente" com a popularidade de Lula e limitam sua atuação à discreta indignação. Não produzem um só fato, como fazia o PT quando estava no outro lado do balcão e, em geral, auxiliava a imprensa nas denúncias dos malfeitos e, nas comissões de inquérito, trabalhava duro nas investigações. Acabava pautando o noticiário.

Hoje ocorre o contrário: a oposição é pautada pela imprensa. Vai e volta ao sabor do que é publicado nos jornais e revistas ou divulgado na televisão.
A indolência é o padrão. Quem ousa pôr alguns pingos em determinados is é apontado como radical ou desviante funcional.
É o exemplo do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, convidado a "meter o nariz" em outras bandas por registrar o potencial de ilegalidade eleitoral em atos presidenciais.

Quando, e se, alguém resolver dizer ao presidente da República metade do que ele diz a respeito de quem lhe faz doer os calos, aguarde-se: haverá uma enxurrada de críticas à "ofensa" ao símbolo maior da República.
Que o símbolo não se conduza à altura da majestade do cargo não abala nem mesmo aqueles que poderiam ter interesse pragmático em dizer umas verdades, pois terão de enfrentá-lo na próxima eleição presidencial. Não (queira o bom senso) como candidato, mas como cabo eleitoral privilegiado.

Aécio Neves faz o conciliador, José Serra enfia a cabeça nos afazeres! paulistas e os outros ficam igualmente na muda, só que esperando poder contar com as bênçãos do grande personagem mais à frente.
São ações táticas, movidas pelo oportunismo.

Aliás, nesta terra tupiniquim, tirando o fato de que uns passaram a achar Lula um gênio depois que se elegeu presidente, alguns viraram discípulos da capacidade dele de transitar incólume no mar de lama e outros, poucos, o consideram responsável pelos retrocessos na política, mas não dizem isso em público, e ninguém entre os políticos que pretendem governar o País diz o que realmente lhe vai à alma - se é que vai alguma coisa.
Apesar da campanha ativa do sindicalista mor, a raquítica oposição, sob a justificativa de que "é cedo" para abrir a sucessão, se cala ou tergiversa, e todos acabam por resumir o cidadão brasileiro a um objeto de produzir votos, a quem se deve falar apenas quando a eleição chegar e, ainda assim, de acordo com o figurino adequado à conveniência da ocasião.

Enquanto isso, o País fica condenado à mediocridade política; à servidão oportunista; ao caos ético e moral. Se Lula reina soberano, não é apenas por habilidade de visão nesta terra de cegos. É, sobretudo, porque o Brasil está moralmente doente, virou uma terra de sanguessugas, de oportunistas, e de covardes...



O artigo original: Terra de Cego é de Dora Kramer. Está editado pelo Freeman.

2 comentários:

Saramar disse...

Dora Kramer é uma das poucas vozes que ainda ouvimos na análise da degradação evidente dos homens públicos brasileiros, estes mesmos que estão fazendo ouvidos moucos diante da gravidade do que assistimos todos os dias.

Nuno Castelo-Branco disse...

Alguns dos meus amigos brasileiros aqui em Lisboa, por vezes dizem que um dos maiores erros da história do Brasil, foi o ter acatado a golpada dos militares que depuseram a Monarquia. também me parece.