quinta-feira, dezembro 08, 2005

Afinal, o que faz um burocrata?

-O que você faz?
-Sou assistente do chefe da administração.
-O que seu chefe administra?
-Eu.
-Entendo...Mas o que você faz a maior parte do tempo?
-Mantenho meu emprego.
-O que você faz para manter seu emprego?
-Eu digo “não!”.
- “Não,” para quê?
-Para tudo.
-Mas, por quê você diz “não” para tudo?
-Porque se disser “sim”, perco meu emprego!
-Pode explicar isso melhor?
-Claro. Se vivêssemos num país realmente livre e conseqüentemente as pessoas tivessem liberdade para comprar, vender, investir, viajar, exportar, importar, criar negócios, etc., não haveria necessidade de tantos documentos e licenças que elas são obrigadas a ter, desde o nascimento até a morte. E se não houvesse necessidade desses documentos, onde ficaríamos nós, os burocratas? Não teríamos empregos, ou teríamos muito poucos empregos.
-Mas se as pessoas precisam desses documentos para suas realizações, como você pode dizer “não”?
-Ah! Um burocrata, esperto nunca usa a palavra “não”. Dizemos: “Seu caso está sendo estudado” ou “seu processo está em andamento”.
-E isso quer dizer que o assunto está debaixo de uma pilha de papéis, certo?
-Certo! E dizemos ainda: “Seu caso agora está com o chefe da procuradoria seccional da comissão interministerial não-sei-e-tal! Ou” está com a superintendência aspônica superior “. O que quer dizer obviamente que o papel está com as bordas amareladas de tanto tempo que está no mesmo lugar. Mas chamamos o sujeito e pedimos vários outros dados ou retificações do documento original”.
-Como os burocratas pensam?
-Nós não pensamos. Apenas procuramos estudar os meandros do sistema. Não para simplificarmos as coisas, mas para complicar, tornando nossos empregos mais estáveis. Além disso, sempre que possível ajudamos os políticos a criarem mais algum órgão, comissão ou secretaria. Autarquias e ministérios são nossa especialidade – e os políticos adoram isso! Por outro lado, raramente tiramos férias. Normalmente estamos de licença-prêmio, ou conseguimos afastamentos temporários para cuidar de nossos interesses pessoais.
-Como vocês agem para não serem espancados por uma multidão furiosa, por essas atitudes?
-Isso é fácil. Nós mantemos distância do público. Principalmente nos grandes centros, nos instalamos em edifícios grandiosos para fazer o público pensar que é inferior. Usamos porteiros e guardas uniformizados para intimidá-los. Possuímos infinitas salas, corredores e guichês. Temos ainda um batalhão de assistentes, funcionários e secretárias para fazer as pessoas sentirem a nossa importância, e nunca atendemos ninguém na hora marcada, que é para cansá-los! Usamos formulários enormes, para fazê-los preencher tudo sobre suas vidas, mesmo coisas que não sejam da nossa alçada. Finalmente chegamos às 11, ficamos fora em almoços de três horas e saímos invariavelmente antes das cinco horas.
-Mas o público não reclama com os políticos e a imprensa?
-Claro, a toda hora. Mas nunca ninguém entre nós é responsabilizado. Sempre se culpa “o sistema”, e os políticos jamais tem coragem de mudar o sistema.
-Qual é o maior desejo dos burocratas?
-Poder e privilégios
-Privilégios até entendo, muita gente quer: como os próprios políticos e os sindicatos, mas poder? Que tipo de poder: político, financeiro, militar?
-Isso é que nós queremos que a sociedade pense. Nós é que redigimos as proposições das leis, dos decretos, das regulamentações e sugerimos aos diversos setores, deixando-os imaginar que “eles” é que tomaram as decisões. E tão logo tenham feito seus pronunciamentos, nós “implementamos” da forma que nós queremos.
-Então é por isso que tudo fica tão “amarrado”, e acaba custando tão caro, neste país?
-Não, na verdade damos estabilidade em tudo, nós achamos melhor manter tudo estático.
-Mas, afinal, como vocês sentem satisfação?
-Controlando as pessoas. Manipulando a sociedade. Fazendo as pessoas ficar em filas, preenchendo montanhas de papéis, fazê-las ziguezaguear por inúmeros órgãos e repartições sempre em busca de um carimbo a mais...
-E sempre o poder de dizer “não...”
-Claro! E sempre o poder de dizer “não”!

esta é uma entrevista fictícia adaptada e editada por Freeman. Foi criada pelo burocrata internacional V.T. Vittachi, que viveu alguns anos no Brasil.

5 comentários:

Anônimo disse...

Perfeito o post. Descreveu muito bemo mundo kafkiano em que vivemos, principalmente sob a ditadura petista, na qual o sim só é ouvido entre amigos do rei.
Parabéns.



P.S. Posso colocar um link do seu blog no meu?

palavras outras.blogspot.com disse...

Olá,Saramar
Que bom tenha gostado. Sobre o link, claro que pode e obrigado pelas visitas. Já visitei sua página, também.
Um abraço

Santa disse...

Muito bom o post.

A Prefeitura de Recife,próximo das eleições passada, contratou a peso de ouro (sem licitação) uma empresa de consultoria do Paraná para implantar um novo modelo de gestão, modernização , etc. O que resultou disso? 1. Criaram um sistema de comunicação com objetivo claro eleitoreiro; 2. Reformularam o organograma com a criação de 361 cargos, com setores e sub setores, com a seguinte demanda: 01 chefe para cada 01 chefiado; 3. No que diz respeito a gestão de pessoal, relações interpessoais, desburocratização, gestão de público, serviços,etc., etc., reforçaram exatamente com o que está postado aqui.

Bjs.

Anônimo disse...

É disso que se trata. A palavra burocracia acabou se transformando em sinônimo de coisa ruim, quando na realidade deveria ser sinônimo de bem administrar a coisa pública.
Pela baixa qualidade de nossos agentes políticos, as instituições estão na berlinda da ineficácia. Não há hoje no País uma instituição sequer que não seja vista com desconfiança. Assim, jamais seremos um grande País, jamais teremos regras sólidadas, a capacidade de previsão jamais será exercitada e a cidadania sempre estará desrespeitada.
É preciso dar um fim nessa situação antes que outros ineficazes logrem empolgar o poder e continuem a toldar a caminhada para um futuro melhor do que esse.
Caso apenas nos sobre a arma do voto, então vamos a ele. Entendo que pelo menos já temos claro quem merece e quem não merece mais ser eleito.

Anônimo disse...

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